Tecné, Episteme y Didaxis: TED
0121-3814
Universidad Pedagógica Nacional; Facultad de Ciencia y Tecnología
https://doi.org/10.17227/ted.num52-14954

Recibido: 8 de noviembre de 2021; Aceptado: 26 de abril de 2022

Visões de mundo de crianças na elaboração de programas escolares na Educação em Ciências com base em Paulo Freire


Children’s Worldviews in the Development of School Science Education Programs Based on Paulo Freire


Cosmovisiones de los niños en el desarrollo de programas escolares de Enseñanza de las ciencias a partir de Paulo Freire

L. Barbosa, * A. Solino, ** S. Gehlen, ***

Mestre em Educação em Ciências pela Universidade Estadual de Santa Cruz, Ilhéus, Bahia, Brasil. ticiapedagogia2012@gmail.com. Orcid: https://orcid.org/0000-0002-1432-7130 Universidade Estadual de Santa Cruz Universidade Estadual de Santa Cruz Ilhéus Bahia Brazil
Doutora em Educação pela Universidade de São Paulo. Professora da Universidade Federal de Alagoas (UFAL, Campus Sertão). Delmiro Gouveia, Alagoas, Brasil. ana.solino@delmiro.ufal.br. Orcid: https://orcid.org/0000-0003-4232-4516 Universidade de São Paulo Universidade de São Paulo Brazil
Doutora em Educação Científica e Tecnológica pela Universidade Federal de Santa Catarina; Professora no Departamento de Ciências Exatas e Tecnológicas; Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e Matemática; Universidade Estadual de Santa Cruz - Ilhéus, Bahia, Brasil. stgehlen@uesc.br. Orcid: https://orcid.org/0000-0002-9786-3392 Universidade Estadual de Santa Cruz Universidade Estadual de Santa Cruz Ilhéus Bahia Brazil

Resumo

Baseado nos pressupostos de Paulo Freire, o objetivo da presente pesquisa consiste em investigar de que forma é possível ouvir as crianças e qual o papel de suas visões de mundo na elaboração de programas escolares via Tema Geradores. Para isso, foi realizado um processo formativo de professores de uma escola de Educação Infantil localizada na cidade de Ilhéus, interior do estado da Bahia, Brasil, durante atividades relacionadas ao processo de obtenção e sistematização de Temas Geradores, consistindo em duas etapas: i) obtenção de desenhos realizados pelas crianças a partir de problemas locais; ii) elaboração da Rede Temática Complementar e da programação escolar, considerando os desenhos e as descrições das crianças. Essas informações foram analisadas mediante uma Análise Textual Discursiva, orientada pelas seguintes categorias: i) a visão de mundo das crianças expressa nos desenhos e ii) inserção da visão de mundo das crianças na programação escolar. Dentre os resultados, destaca-se a importância de garantir espaços de participação dos educandos, em especial das crianças pequenas na organização da programação escolar, uma vez que as suas visões de mundo podem ampliar, complementar e/ou legitimar as situações-limites da comunidade local, na procura de uma educação infantil mais humana e democrática.

Palavras-Chave:

Paulo Freire, ensino de ciências, tema gerador, educação infantil.

Abstract

Based on Paulo Freire’s assumptions, the objective of this research is to investigate how it is possible to listen to children and what is the role of their worldviews in the development of school programs via Generating Themes. For this purpose, a training process was carried out for teachers from a kindergarten school located in the city of Ilhéus, in the interior of the state of Bahia, Brazil, during activities related to the process of obtaining and systematizing Generating Themes, consisting of two stages: i) obtaining drawings made by children based on local problems; ii) elaboration of the Complementary Thematic Network and school programming, considering the children’s drawings and descriptions. This information was analysed using Discursive Textual Analysis, guided by the following categories: i) the children’s worldview expressed in the drawings and ii) the inclusion of the children’s worldview in-school programming. Among the results, the importance of ensuring spaces for the participation of students, especially young children, in the organization of school programming stands out, since their views of the world can expand, complement and/or legitimize the limiting situations of the community in search of a more humane and democratic early childhood education.

Keywords:

Paulo Freire, science teaching, generating theme, early childhood education.

Resumen

A partir de los supuestos de Paulo Freire, el objetivo de este artículo dee investigación es investigar cómo es posible escuchar a los niños y cuál es el papel de sus cosmovisiones en el desarrollo de programas escolares a partir de Temas Generadores. Para ello, se llevó a cabo un proceso de capacitación a docentes de una escuela infantil ubicada en la ciudad de Ilhéus, Bahía, Brasil. Durante las actividades relacionadas con el proceso de obtención y sistematización de Temas Generadores, que constó de dos etapas: i) obtención de dibujos hechos por niños basados en problemas locales; ii) elaboración de la Red Temática Complementaria y programación escolar, considerando los dibujos y descripciones de los niños. Esta información fue analizada mediante Análisis Textual Discursivo, guiado por las siguientes categorías: i) la cosmovisión de los niños expresada en los dibujos y ii) la inclusión de la cosmovisión de los niños en la programación escolar. Entre los resultados, se destacó la importancia de asegurar espacios para la participación de los estudiantes, especialmente los niños pequeños en la organización de la programación escolar, ya que sus cosmovisiones pueden ampliar, complementar y/o legitimar las situaciones limitantes de las comunidades locales, en busca de una educación infantil más humana y democrática.

Palabras clave:

Paulo Freire, enseñanza de las ciencias, generador de temas, educación infantil.

Introdução

Alguns estudos da área de Educação em Ciências na América Latina, em especial, no Brasil, tem objetivado compreender e propor mudanças significativas em práticas educativas, por meio da reconstrução de currículos escolares tendo como referência pressupostos de Paulo Freire, como a problematização e a dialogicidade. Uma dessas mudanças tem sido a forma efetiva de participação da comunidade local e escolar, na definição de conteúdos, conceitos e ações para serem trabalhados em sala de aula; realizados, por exemplo, por meio da Investigação Temática (it) (Delizoicov et al., 2020; Centa e Muenchen, 2018; Demartini e Silva, 2021; Milli et al., 2018; Solino et al., 2021).

O processo de it (Freire, 1987) vem sendo referência para selecionar Temas Geradores, a partir da identificação de situações-limites, ou seja, concepções ingênuas sobre os problemas locais vivenciados por sujeitos de uma determinada comunidade. A it foi inspirada na dinâmica de obtenção e seleção de Palavras Geradoras, utilizada por Freire em atividades com foco na Alfabetização de Jovens e Adultos e sistematizado no livro “Pedagogia do Oprimido” (Freire, 1987).

No Brasil, alguns pesquisadores da área de Educação em Ciências têm buscado novas contextualizações para a it, com o objetivo de ampliar a proposta para o ambiente escolar, a exemplo de Delizoicov (1991) que sistematizou as etapas da it, destacando as ações desenvolvidas pelo pesquisador em cada uma delas, a saber: 1) Levantamento Preliminar; 2) Análise das situações e escolhas das codificações; 3) Diálogos Descodificadores; 4) Redução Temática. Além disso, o autor incluiu uma quinta etapa, denominada de Sala de Aula, referente ao trabalho didático-pedagógico a ser desenvolvido pelo educador.

Contribuições da perspectiva freireana num contexto de Educação Infantil podem ser encontradas em pesquisas brasileiras, a exemplo de Leite e Duarte (2007), Scherer (2011); Marafon (2012) e Rambo (2017). No entanto, existe a necessidade de ampliar os estudos que procuram incluir a participação de educandos na sua construção, em especial, de crianças em idade pré-escolar, a partir da ressignificação curricular via Temas Geradores. Isso é importante porque a criança não pode ser considerada um objeto, uma vez que “podemos pesquisar com crianças e não apenas às crianças, inserindo-as no processo de pesquisa e mantendo uma escuta do que elas nos têm a dizer” (Cruz, 2012, p. 67). No campo da Educação em Ciências para Educação Infantil, ainda são incipientes os estudos na área (Fujihara y Labarce, 2017), o que remete para a necessidade de propor um trabalho didático-pedagógico que contemple de fato as necessidades de aprendizagens das crianças. Nesse sentido, emergem os seguintes questionamentos: se na pedagogia freireana é crucial considerar as vozes e visões de mundo dos sujeitos durante o processo de investigação dos Temas Geradores; então de qual forma podemos garantir, no contexto da Educação Infantil, a participação de crianças na busca pelos temas? Como é possível tornar as crianças sujeitos participantes da construção curricular de ciências?

Este trabalho tem como objetivo investigar de que forma é possível ouvir as crianças e qual o papel de suas visões de mundo na elaboração de programas escolares, tendo como referência Tema Geradores. Parte-se do pressuposto de que na Educação Infantil é possível promover práticas escolares fundamentadas que vislumbram fortalecer um espaço de escuta, com informações diversas, problematizações, que as façam refletir sobre seu entorno e pensar sobre modos de vida, paisagem, histórias de outros tempos que remetam ao seu mundo, garantindo uma aprendizagem humanizadora.

Referencial teórico

A perspectiva freireana na participação efetiva de crianças na Educação em Ciências

A historiografia da Educação para o campo da Educação Infantil Ocorreu no contexto de grandes desafios e vem traçando ao longo dos tempos espaços de lutas e conquistas com a finalidade de favorecer e oferecer uma infância com oportunidades de aprendizagens, possibilitando o seu desenvolvimento integral. Reconhecida como primeira etapa da educação básica, a Educação Infantil, como dever do Estado, “tem como finalidade o desenvolvimento integral da criança de até 5 (cinco) anos, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social” (Brasil, 1996 1).

No contexto brasileiro muitos foram os avanços em relação ao campo da Educação Infantil que, na contemporaneidade, reconhece a criança como ser de direitos, pensante, ativa e criativa e que, por meio das experiências e das interações com outros e com o mundo se desenvolve socialmente, rompendo com uma concepção tradicional de sujeito vazio, como “tabula rasa” (Rambo, 2017). Essa ressignificação da ideia de criança e infância tem sido fortemente demarcada em documentos curriculares oficiais a partir do final da década de 1990 com os Referenciais Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (RCNEI, 1998), com as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (DCNEI, 2010) e com a Base Nacional Comum Curricular (BNCC, 2017).

Alguns estudiosos têm destacado a importância de garantir efetivamente a participação infantil nas decisões sobre a vida pública, como forma de superar os processos de exclusão e opressão vivenciados por esse grupo social (Peloso e Paula, 2021; Vicente e Silva, 2020; Sarmento et al., 2017). Isso porque, ainda, é muito comum encontrar situações em que as vozes das crianças são silenciadas em razão das posturas reacionárias dos adultos ao desacreditarem na potencialidade delas, compreendendo-as como seres incapazes de analisar ou inferir percepções sobre seu mundo (Peloso e Paula, 2021).

Sarmento et al. (2017), respaldados na perspectiva da Sociologia da Infância, entendem que não se deve esperar que a participação política das crianças seja uma mera cópia dos modos de agir do adulto, uma vez que é necessário respeitar as culturas das infâncias. Os autores argumentam, com base em experiências infantis de participação em projetos de intervenção em Portugal, que as crianças são capazes de se-envolver ativamente, de avaliar e interpretar os efeitos das decisões e suas consequências. Essa capacidade pode ser melhor desenvolvida quando são oferecidas oportunidades reais de participação nos ambientes públicos, a exemplo dos espaços educativos (Sarmento et al., 2017).

Trabalhos pautados na perspectiva freireana têm buscado propor ou avaliar experiências de participação de crianças na elaboração e implementação de planejamentos escolares. Silva (2017), por exemplo, analisou o exercício do olhar e da escuta sensível de educadoras durante a elaboração e desenvolvimento de brincadeiras junto às crianças de 0 a 3 anos de idade. O trabalho realizado em três creches municipais de São Bernardo do Campo-SP, no âmbito do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID), do curso de Pedagogia da Universidade Metodista de São Paulo, sinaliza que “o aprendizado do silenciar diante das crianças tem-nos permitido o encontro dialógico e amoroso com elas, o que nos leva a oportunizarlhes espaços em que possam dizer a sua palavra, em que possam potencializar as suas experiências” (Silva, 2017, p. 97).

Outro exemplo é o estudo de Scherer (2011) que, ao analisar a constituição do Projeto Político Pedagógico (PPP) da Educação Infantil baseado em Paulo Freire e coordenado pela Secretaria Municipal de Educação de Chapecó-SC, nos períodos de 1997 a 2004, revelou o caráter participativo das crianças durante o processo de busca dos Temas Geradores. A partir de observações dos modos de brincar das crianças por meio de simulações de situações vivenciadas por elas e de conversas com seus familiares, foi possível mapear o seu universo cultural. Nesse estudo da realidade, as falas significativas das crianças foram selecionadas considerando três critérios: falas descritivas, falas analíticas e falas propositivas, as quais permitiram evidenciar os limites explicativos da realidade vivida por elas. O estudo, ainda, mostrou que a partir da participação efetiva das crianças no processo de elaboração do PPP foi possível localizar o Tema Gerador, isso serviu como base para estruturação das atividades didático-pedagógicas.

Embora boa parte das experiências de Freire tenham ocorrido em contextos não formais de ensino, existem indicativos de que este educador defende o direito das crianças de expressão de sua palavra, assim como o direito à participação nas esferas da sua vida familiar e escolar (Vicente e Silva, 2020). Peloso e Paula (2021), baseados em Freire, também ressaltam a necessidade de dar maior visibilidade às crianças nos seus diferentes espaços de atuação, assegurando seus direitos de ser e estar no mundo verdadeiramente.

Na Educação Infantil, considerando os estudos sobre o Ensino de Ciências, ainda são poucos aqueles que têm fomentado a participação infantil nas decisões sobre o desenvolvimento do currículo e atividades escolares (Eiras et al., 2018). Rambo (2017), por exemplo, evidenciou a escassez de pesquisas utilizando Paulo Freire na Educação em Ciências com foco na Educação Infantil. A autora defende a possibilidade de uma pedagogia freireana para esta primeira etapa da educação, comprometida com humanização e dialogicidade, evidenciado a importância da ressignificação curricular por meio do processo de it, para obtenção e desenvolvimento dos Temas Geradores.

A Rede Temática na elaboração de programas escolares

Na perspectiva freireana, uma das formas de se-obter a compreensão dos sujeitos sobre a realidade em que eles vivem, se dá por meio da it, em que são selecionados Temas Geradores. Essas compreensões, muitas vezes, são representações de contradições sociais e revelam os níveis de percepção da realidade dos homens, isto é, as suas visões de mundo (Freire, 1987).

Freire (1967) desenvolveu algumas etapas para a it tendo como referência sua atuação na Alfabetização de Jovens e Adultos, durante o trabalho em Angicos/RN, no Brasil. Essas etapas foram contextualizadas por Delizoicov (1991) para a educação escolar, compreendendo: 1) Levantamento preliminar: obtenção de informações da comunidade local para identificar possíveis problemas vivenciados pelos sujeitos; 2) Codificação: análise das informações e escolha de possíveis situações-limites; 3) Diálogos descodificadores: compreensão dos sujeitos acerca das situações significativas apresentadas e legitimação das situações-limites emergindo o Tema Gerador; 4) Redução Temática: seleção e planejamento de conhecimentos e conteúdos de diversas áreas de conhecimento, para entendimento do Tema Gerador. O planejamento das atividades que serão implementadas em sala de aula, seguem a dinâmica dos Três Momentos Pedagógicos (3MP) e os Conceitos Unificadores; 5) Desenvolvimento em sala de aula: desenvolvimento das atividades planejadas em sala de aula.

Entende-se que há elementos essenciais dessa proposta para serem incorporados na Educação Infantil, como aqueles relacionados à valorização do sujeito da aprendizagem e o seu protagonismo, podendo ser trabalhados a partir de práticas que possibilitem o exercício da escuta desse público (Sans,1994). Um estudo inicial considerando essas questões foi realizado por Rambo (2017), que defendeu a necessidade de articular a pedagogia freireana ao trabalho com crianças na educação em ciências, tendo como base a brincadeira e os 3MP.

Discussões relacionadas ao processo de it, tal como as apresentadas por Freire (1987) e pesquisadores da área de Educação em Ciências, articulam-se com a Educação Infantil no sentido de dar legitimidade às atividades lúdicas permitindo a participação das crianças. E um dos caminhos para dar visibilidade às diferentes visões de mundo de sujeitos, que participam de processos de reconstrução curricular, é a etapa da Redução Temática - quarta etapa da it na obtenção de Temas Geradores (Silva, 2004).

Segundo Silva (2004), na etapa da Redução Temática é possível construir uma rede que integra diferentes visões da comunidade escolar e local, denominada de Rede Temática (RT), a qual consiste na organização dessas distintas visões para compreensão da realidade por parte dos sujeitos. A estruturação da RT contempla os seguintes aspectos: Tema Gerador, Contratema, Situação Problema, Visão da Comunidade, Visão dos Educadores, Questão Geradora, que são distribuídos entre a base e o topo da RT. A Figura 1 mostra como a RT pode ser organizada:

Estrutura da Rede Temática

Figura 1:: Estrutura da Rede Temática

Fonte: Fonseca (2017, p. 89).

Silva (2004, p. 249) destaca que a RT precisa de ser entendida como orientadora na sistematização da programação pedagógica, sendo que em sua composição “são indispensáveis as contradições que a comunidade vivencia, destacando que é essencial elencar os limites explicativos dos sujeitos que constituem a comunidade e as alternativas para que sejam superadas tais situações”. Na RT (Figura 1), os limites explicativos dos sujeitos são explicitados em sua base, por meio das falas significativas que apresentam a visão da comunidade, correspondendo à denúncia (Silva, 2004). Tais falas revelam as situações-limites que denotam uma visão menos crítica sobre a realidade em que vivem, representando o Tema Gerador. Já as alternativas para superar esses limites explicativos - o que seria o anúncio - são apresentados no topo da RT, com objetivo de superação de problemas no âmbito micro e macro social. O Contratema se estabelece enquanto uma proposta de ação para orientar os educandos na superação de suas visões limítrofes sobre a realidade em que vivem, sendo formulado enquanto antítese do problema (Silva, 2004).

O papel da RT, em suma, representa a leitura coletiva da comunidade local e a sistematização de elementos fundamentais para serem trabalhados no contexto escolar. Na Educação Infantil é importante que as visões das crianças possam fazer parte da RT. Elas também são sujeitos da comunidade e, como tal, apresentam suas visões de mundo, que precisam ser ouvidas e consideradas na elaboração do planejamento de programas escolares e em atividades didático-pedagógicas.

Metodologia

A pesquisa foi realizada em uma escola de Educação Infantil, localizada no bairro Iguape, em uma cidade do Nordeste Brasileiro, quando a mesma atendia aproximadamente 60 crianças carentes na faixa etária de 03 a 05 anos de idade. O bairro Iguape é banhado pelo mar e por um rio, sendo que nos fundos da escola Padre Giuseppe Bonomi fica localizado um mangue que chama atenção das crianças, principalmente pela presença constante de animais como guaiamus, aves e saguis. (Assunção, 2019).

Em colaboração com o grupo geatec2, desenvolveu-se na escola processos formativos para elaboração do ppp, da programação curricular e de atividades lúdicas para as crianças, tendo como base situações significativas vivenciadas pela comunidade escolar e local, sintetizadas em Temas Geradores, obtidos por meio de etapas da IT (Delizoicov, 1991; Sousa et al., 2014). Essas formações3 foram desenvolvidas com 8 (oito) educadoras, durante os meses de setembro de 2017 a novembro de 2018, totalizando 80h de carga horária (Assunção, 2019; Barbosa, 2020).

Na elaboração da Rede Temática, as educadoras participaram ativamente da seleção dos conceitos, conhecimentos e práticas a serem desenvolvidos em sala de aula, tendo como foco o Tema Gerador “As riquezas naturais do Iguape: entre o discurso e a prática”. Contudo, percebeu-se a necessidade de também envolver as crianças nessa construção, na procura de entender suas visões de mundo sobre os problemas ambientais vivenciados por elas e seus familiares. Assim, ampliou-se a Rede Temática com o olhar das crianças, para além das visões das educadoras e da comunidade local, passando a ser denominada de Rede Temática Complementar (RTC).

As informações sobre as visões de mundo das crianças expressas em falas e desenhos, foram obtidas em um momento anterior ao processo de it, no âmbito do projeto “Turma do Mangue”, em que elas apresentaram suas compreensões sobre como é o mangue que fica no fundo de suas casas e como gostariam que ele fosse. Participaram dessa pesquisa 18 (dezoito) crianças com idade de cinco anos que frequentavam a turma de pré-escola no turno da manhã. A escolha desta turma justifica-se devido à participação ativa, no processo formativo, de duas professoras que atuavam nessa turma, além do fato das crianças estarem na fase de transição para alfabetização. A análise dos desenhos e das falas das crianças sobre eles foi realizada por meio da Análise Textual Discursiva (Moraes e Galiazzi, 2011), norteada pelas categorias de análise: i) a visão de mundo das crianças expressa em desenhos e ii) inserção da visão de mundo das crianças na programação escolar. A fim de preservar a identidade das crianças estas foram identificadas da seguinte forma: cr1, cr2, cr3 e cr4.

Resultados e análise

i) A visão de mundo das crianças expressa em desenhos

Uma das maneiras de promover a participação e a escuta das crianças na elaboração da programação escolar foi garantir, inicialmente, espaço para expor suas percepções e vivências em desenhos, considerando que são crianças da pré-escola e estão no processo para aquisição da leitura e escrita formal e, geralmente, o desenho é uma das formas de melhor descrever e de significar o mundo de acordo com a observação que a criança faz do seu entorno (Garrido e Meirelle, 2014). Na escola Padre Giuseppe Bonomi os desenhos das crianças possuem uma significação especial para as educadoras, pois são compreendidos como instrumentos para avaliar a transição de etapas pelas crianças, ou seja, indicam o processo de desenvolvimento infantil.

Os desenhos das crianças (Figuras 2, 3, 4 e 5) realizados sobre aspectos relacionados ao mangue, que fica no fundo da casa e da escola, apresentam em comum a paisagem do mangue com árvores, nuvens, sol, caranguejo, pessoas, lixo e rio. Outro aspecto muito presente nos desenhos foi o lixo no mangue, o que indica a percepção delas sobre o ambiente manguezal.

Desenho 1

Figura 2:: Desenho 1

Fonte: dados da pesquisa.

Desenho 2

Figura 3:: Desenho 2

Fonte: dados da pesquisa.

Desenho 3

Figura 4:: Desenho 3

Fonte: dados da pesquisa.

Desenho 4

Figura 5:: Desenho 4

Fonte: dados da pesquisa.

Para complementar a análise dos desenhos, foi solicitado que cada criança explicasse oralmente o que tinha sido representado. Esse registro transcrito pelas educadoras foi fundamental para compreender melhor a forma de pensar das crianças sobre o meio em que vivem (Garrido e Meirelles, 2014), ampliando as informações presentes no desenho. Isso possibilitou identificar complementaridades entre as visões de mundo das crianças e as visões de mundo da comunidade local, que representam indicativos de situações-limites (Freire, 1987), expressas em falas de moradores do bairro Iguape, na qual as crianças residiam, conforme Figura 6:

Visões de mundo das crianças e dos moradores do bairro Iguape.

Figura 6:: Visões de mundo das crianças e dos moradores do bairro Iguape.

Fonte: autoras.

O estudo realizado por Assunção (2019) evidenciou que os moradores do bairro Iguape apresentam algumas situações-limites com relação ao contexto em que vivem, quais sejam: acomodação e aceitação de problemas como a poluição, contradição entre o discurso e a prática, visão limitada do papel do mangue para a comunidade, dentre outras. Sendo assim, pode-se dizer que as situações-limites apresentadas pelos moradores locais também se fazem presentes nas visões das crianças.

Por exemplo, na descrição do desenho 4, a Cr4 diz: “Minha avó só joga lixo no cantinho lá no mangue, que pode”. Na visão da criança, parece ser correto jogar o lixo em um canto do mangue, pois o fato de os resíduos não estarem espalhados a leva a crer que não há poluição. Contudo, as interpretações da criança representadas no desenho apontam para a degradação do Manguezal local, o que indica que os lixos ao se encontrarem com o mar (durante a maré cheia), podem chegar ao mangue e consequentemente até os animais que ali vivem, a exemplo do peixe moreia citado por Cr4 como pesca de sua avó. É importante destacar que essa explicação da criança Cr4 (a partir do desenho 4) apresenta semelhanças com a fala do morador M4, quem afirma que durante a pesca percebeu que as pessoas têm coragem de poluir o local de onde tiram seu próprio sustento.

A descrição do desenho da Cr1: “Gostaria dele limpo, todo limpo e mais caranguejo. Porque poluir dá doença, deixa sujo. Se não pegar com a luva fica doente”, também corrobora com a fala do agente de saúde do bairro, quando diz que ao consumir os alimentos provenientes do mangue as pessoas correm o risco de ficarem doentes. Embora a fala desse agente transfira a responsabilidade do problema ao poder público da cidade ao afirmar que: “até nós mesmo que comemos esses peixes, aí podemos pegar uma doença, isso por falta do poder público né? Que não valoriza, não trabalha”, a criança Cr1, por outro lado, sinaliza um desejo de mudança ao dizer que gostaria de ver o mangue limpo, denotando certa preocupação com o meio em que vive. Isso também parece ficar claro na descrição dos desenhos 2 e 3, quando a Cr2 afirma que “Não tá certo jogar lixo no mangue, porque aí o mangue fica ‘pode’ [podre] e Cr3 diz que: ‘[...] não pode jogar trem no rio, senão o rio não vai ficar limpo, falta de educação (risos...)’”.

As explicações das crianças sobre os desenhos apresentados no Figura 6 revelam um dos principais recursos que as crianças utilizam para aprender que é a imitação, visto que “as crianças imitam uma variedade de ações que vão para além dos limites das suas capacidades” (Fino, 2001, p. 7). Por meio da imitação, as visões de mundo das crianças podem revelar detalhes, especificidades das visões dos moradores que, em alguns momentos, possam ser omitidos e/ou silenciados, a exemplo do desejo de mudança.

Assim, compreende-se que os desenhos das crianças ora reforçam as visões limítrofes dos adultos sobre o problema do mangue, ora sinalizam uma esperança, ao almejarem que o mangue seja um ambiente limpo e saudável para os animais que lá vivem. Com isso, podem complementar e/ou legitimar situações-limites apresentadas pela comunidade local. O que se constatou, aqui, é que as visões das crianças também necessitam ser consideradas no processo de obtenção e sistematização de atividades didático-pedagógicas. Isso está em sintonia com Freire (2011), quando chama atenção para a escuta sensível, da importância de outro ser ouvido: “É importante falar com o sujeito, mas antes disso ele precisa ser escutado, uma vez que “[...] é escutando que aprendemos a falar com eles. Somente quem escuta paciente e criticamente o outro, fala com ele, mesmo que, em certas condições, precisa falar a ele” (Freire, 2011, p.111). Tal constatação possibilitou construir meios para garantir a participação efetiva das crianças na construção da programação escolar, em especial na elaboração da base da Rede Temática Complementar (RTC).

ii) Inserção da visão de mundo das crianças na programação escolar

No processo de obtenção de Temas Geradores, pautado em Freire (1987), a organização da programação curricular é realizada pela Redução Temática - quarta etapa do processo de investigação dos Temas Geradores. É nessa etapa que são selecionados os conhecimentos e ações necessários para a compreensão do Tema Gerador, sintetizados na Rede Temática. Além disso, é realizada a programação escolar, que aqui será denominada de Unidades de Conhecimento, correspondendo a uma sequência de conteúdos e atividades a serem abordados num determinado período escolar.

É importante lembrar que a Rede Temática representa a síntese das inquietações e relações que configuram as programações de sala de aula (Silva, 2004). A visão da comunidade compõe sua base, por meio das falas representativas de situações-limites evidentes no contexto do processo formativo realizado no bairro do Iguape, por meio do levantamento de diversas informações (Assunção, 2019).

Conforme já destacado, na RT, elaborada inicialmente por Assunção (2019), não foram consideradas as visões de mundo das crianças, tampouco suas compreensões sobre a realidade em que viviam. No entanto, Barbosa (2020) evidenciou tal limitação em sua pesquisa e buscou ampliar a configuração da RT, inserindo as percepções das crianças que frequentavam a escola Educação Infantil Padre Giuseppe Bonomi sobre os problemas socioambientais do Mangue. Assim, os desenhos e descrições das crianças apresentadas na categoria anterior foram inseridas na rede, reestruturando-a a partir de seus pontos de vistas, resultando em uma Rede Temática Complementar (RTC), tal como ilustra a Figura 7, que apresenta parte da rede, sobretudo a base, que já havia sido elaborada a partir das falas dos moradores do bairro, conforme estudo de Assunção (2019).

Rede Temática Complementar (RTC)

Figura 7:: Rede Temática Complementar (RTC)

Fonte: adaptado de Barbosa (2020).

Na Figura 7 é possível observar que os desenhos das crianças e suas respectivas descrições somam-se às falas da comunidade local, complementando a estruturação da programação escolar. O que antes na configuração da RT era considerado apenas as falas dos moradores do bairro e representantes do poder público para compor a base da rede, neste trabalho coloca-se em evidência a participação das crianças como sujeitos de direitos e de história. Assim, contemplar as diferentes vozes nesse processo de elaboração do currículo escolar, permite colocar em prática não apenas o direito dos adultos, mas também o das crianças, uma vez que elas também são parte desse projeto educacional. No dizer de Freire (1987), “o conteúdo programático da educação não é uma doação ou uma imposição - um conjunto de informes a ser depositado nos educandos, mas a revolução organizada, sistematizada e acrescentada ao povo”. Assim, o ato educativo que se inicia antes mesmo de chegar à sala de aula deve resultar do diálogo constante entre as visões de mundo dos educadores, da comunidade local e dos educandos.

Ao inserir os desenhos e descrições das crianças na RTC houve a reestruturação das Unidades de Conhecimento (conforme Figura 8), para o contexto do trabalho na perspectiva da pré-escola, em seguida deu-se início à elaboração de algumas atividades didático-pedagógicas, baseadas em brincadeiras com base nos 3mp (Barbosa, 2020; Barbosa et al., 2020).

Unidade de Conhecimento da área de Ciências da Natureza

Figura 8:: Unidade de Conhecimento da área de Ciências da Natureza

Fonte: adaptado de Barbosa (2020, p. 78).

Na Figura 8, apresenta-se um recorte da seleção dos conteúdos voltados para a área de Ciências da Natureza, em que a fala significativa da criança Cr4 e do morador do bairro M3 foram pontos de partida para estabelecer um diálogo com os conhecimentos científicos. Delizoicov, et al. (2011), com base na perspectiva freireana, ressaltam que “é com base no conhecimento empírico do aluno que se deve iniciar o processo educativo, embora esse conhecimento seja também analisado como uma “limitação na possibilidade de perceber mais além” (p. 194).

Kramer (1993) explica que as crianças constroem conhecimentos em diferentes contextos influenciadas pelas ações do dia a dia, o que permite entender seus diferentes modos de inserção no mundo social e físico. Assim, os conhecimentos empíricos construídos pelas crianças em sua casa, no bairro e em espa- ços diversos revelam marcas, histórias e reflexos das suas experiências de vida. A descrição do desenho de Cr4, por exemplo, traz indicativos de situações-limites sobre a forma da criança e de sua avó conviver com o mangue, apontando para um desconhecimento da contradição ali apresentada, uma vez que a criança acredita que jogar lixo no canto do mangue não o polui, permitindo assim usufruí-lo com práticas de pesca e banhos em horas livres de lazer.

A Silva (2004), amparado em Freire (1987), explica que são essas falas significativas (reveladoras de situações-limites) expressas pelos sujeitos que devem organizar o currículo, assim como a programação dos conteúdos, ações e conceitos escolares. Kramer (1993) complementa essa discussão destacando que o trabalho com os Temas Geradores na Educação Infantil:

Significa exatamente a possibilidade de articular, no trabalho pedagógico, a realidade sociocultural das crianças, o desenvolvimento infantil e os interesses específicos que as crianças manifestam, bem como os conhecimentos acumulados historicamente pela humanidade a que todos têm direito ao acesso. Os temas imprimem, ainda, um clima de trabalho em conjunto e de cooperação na medida em que os conhecimentos vão sendo coletivamente construídos, ao mesmo tempo em que são respeitados os interesses individuais e os ritmos diversificados das crianças. (1993, p. 50)

Nesse tipo de organização curricular, a criança passa a ser entendida enquanto sujeito pensante com possibilidades de construir e ressignificar ações e saberes a partir das suas interações com o outro e com o meio que vive. Chama-se atenção para a necessidade de os educadores cada vez mais considerarem as percepções infantis sobre o mundo, desmistificando sua visão adultocêntrica sobre a criança. Scherer (2011) reforça esse argumento, afirmando que a criança:

não pode ser encarada como ‘projeto de adulto’, mas como sujeito que pode crescer, vivenciando, de fato a sua infância, conhecendo sua própria história, podendo tomar decisões e iniciativas para a manifestação e a modificação das práticas sociais próprias da idade. (p. 63)

Com a intenção de garantir a participação das crianças neste trabalho, todos os conteúdos escolares foram selecionados tendo em vista as visões da comunidade local e das crianças. Na Unidade 1 relativa a área de Ciências da Natureza, expressa na Figura 9, pode-se ver conteúdos como poluição das águas, resíduos domésticos no manguezal e no rio, doenças, contaminação dos animais e alimentos, entre outros. Compreende-se que esses conhecimentos são fundamentais para ajudar as crianças a ampliarem suas visões de mundo e consequentemente, transformarem seus modos de vida.

Dando continuidade à programação escolar, foram elaboradas atividades didático-pedagógicas para a Educação Infantil, tendo como estratégia os Três Momentos Pedagógicos (Delizoicov et al., 2011), conforme Figura 9:

Exemplo de um plano de aula de Ciências da Natureza

Figura 9:: Exemplo de um plano de aula de Ciências da Natureza

Fonte: adaptado de Barbosa (2020, p. 81).

Ainda tomando como ponto de partida a fala significativa da Cr4, o trabalho de sala de aula organizado pelas educadoras foi baseado na promoção de interações e brincadeiras, as quais são consideradas eixos centrais das práticas pedagógicas da Educação Infantil (DCNEI, 2010; BNCC, 2017). Neste exemplo explicitado na Figura 9, as crianças inicialmente são convidadas a cantar a cantiga popular “Caranguejo não é peixe”, a qual posteriormente é acompanhada de algumas problematizações sobre a canção e sua relação com o manguezal, tais como: O que tem no manguezal? Sabem o que acontece quando jogamos resíduos domésticos no mangue? Para onde vão esses resíduos? Será que os animais ficam contentes ao se encontrarem com eles. Esse momento é importante para as educadoras perceberem as concepções iniciais das crianças. Em seguida, na organização do conhecimento é proposta a “Brincadeirinha do Mangue”. Nessa brincadeira, as crianças protagonizaram uma encenação, em que um grupo representou os animais (caranguejo, peixe) e outro representou os resíduos (lixos). A intenção era que ao final do jogo as crianças compreendessem o transporte de resíduos no mangue e suas relações com as marés, a partir das fases da Lua. No último momento da atividade, as problematizações iniciais foram retomadas e em seguida apresentada imagens de animais presos em resíduos e um vídeo explicativo sobre o assunto. Após o diálogo com as crianças foi proposto que desenhassem sobre o que entenderam da atividade realizada.

Tradicionalmente, as práticas educativas têm sido comumente organizadas de modo a impor conteúdos, ações e práticas desconexas da realidade vivencial dos sujeitos, moldando o educando, em especial a criança pequena (Scherer, 2011). No entanto, a proposta freireana vai na contramão desse tipo de educação, propondo que todo o conjunto de ações a serem desenvolvidas para a elaboração da programação escolar seja realizada conjuntamente com a comunidade local e educandos, ou seja, construindo uma proposta com o povo e não para o povo. Para Freire (1987) é fundamental dar visibilidade para todos os sujeitos que fazem parte da escola e da comunidade local na construção de uma proposta educacional libertadora, de modo a garantir espaços múltiplos de participação e possibilitar a construção de uma educação mais humana e democrática.

Considerações finais

O desenvolvimento do presente estudo apresentou indicativos de que durante o processo de Investigação Temática, na obtenção de Temas Geradores, é fundamental ouvir as crianças, identificar suas visões de mundo, sendo uma das formas o desenho e suas explicações sobre ele. O que se constatou foi que os desenhos realizados pelas crianças, representando a realidade em que vivem - que no caso envolveu o mangue do bairro Iguape -, muitas vezes, são imitações das visões de mundo dos moradores deste local e podem complementar e/ou legitimar situações-limites destes e, com isso, contribuir na seleção de Temas Geradores, como apresentado na Rede Temática Complementar.

As situações-limite são a essência de Temas Geradores e a identificação delas também tem sido foco de algumas pesquisas, na área de Educação em Ciências, como Magalhães et al. (2016), Rocha (2013) como na Educação Infantil, a exemplo de Scherer (2011). O presente estudo avança em relação a essas pesquisas, em especial, por sistematizar, por meio dos desenhos, na RTC, as visões da comunidade local e as visões das crianças, uma vez que isso nem sempre tem sido explicitado em processos de reconstrução curricular, pautados em Freire. Assim, fica claro que as compreensões das crianças exercem um papel importante na seleção de conceitos científicos e ações a serem realizadas no contexto escolar, o que foi apresentado na organização das Unidades de Conhecimento.

Nesse sentido, a presente pesquisa destacou a importância de garantir a participação das crianças na seleção de Temas Geradores, em especial na organização de atividades da Educação Infantil. Ao se pensar em outras etapas da Educação Básica, como o Ensino Fundamental e Médio, chama-se atenção para a necessidade de também considerar as falas dos educandos no processo de construção da programação escolar. Ou seja, a importância da Alteridade, no sentido de perceber o outro enquanto Ser Mais (Delizoicov e Silva, 2021).